domingo, 12 de maio de 2013

CABEÇA QUE NÃO TEM JUIZO! O CORPO É QUE PAGA


Já escrevi neste e noutros blogs onde tenho passado a escrito algumas passagens da minha vida (que para mal dos meus pecados tem muito que contar), em especial enquanto Criança e na adolescência! Assim, e porque nos últimos dias falei aqui e acolá, nos meus encontros e desencontros com alguns dignitários da Igreja, aqui deixo mais umas pérolas. Direi que tive um principio de vida algo atribulada, estilhaçou com estrondo quando ainda criança (por informação da minha Mãe pois nada recordo) terei caído de um cedro do Adro da Igreja, ali mesmo junto á minha casa quando andava aos ninhos (sempre os pardais a mexerem comigo, deve ter sido castigo divino por andar a fazer mal aos passarinhos) nessa queda devo ter desapertado alguns parafusos da caixa dos pirolitos, pois fiquei desacordado algum tempo, ou então já nasci desaparafusado e a coisa assim ainda é mais complicada, e daí para a frente foi sempre a acelerar, até um dia, há sempre um dia para tudo.

Assim, com o passar dos anos, e após a minha estadia falhada na Marinha, quando o desaperto dos parafusos já tinham dado lugar á  desaparafusação total, dormir não era comigo, passava as noites na companhia dos meus Amigos «Chico e Zé» padeiros eles a trabalhar eu a ver e ajudar alguma coisa, e especialmente ouvindo anedotas inesgotáveis do Amigo Zé, por vezes parecia-me que estava com sono, despedia-me e ia para casa, passados poucos minutos já estava de volta, o Amigo Zé começou a ficar alarmado e contou á Esposa Dª Isabel que por sua vez falou com a Professora D. Adelina que estava hospedada lá em casa, e esta por sua vez falou com o Padre Morais (tudo isto sem eu saber pois não me passava pela cabeça que andava desaparafusado) assim depois destes conversarem entre si (é o que penso)  chega-me o convite para ir dar uma volta com o Padre, que este queria falar comigo.

Embora tenha no meu inicio de vida frequentado a Igreja, muito cedo deixei de o fazer, pelo que fiquei admirado do convite, mas não o recusei e lá embarquei no Hillman Imp do Padre Morais que aproou á Serra de Montejunto, lá chegados, parou o carro disse algumas palavras de circunstância, com linda vista etc. e disse-me sem rodeios que estava ali para me ajudar, e que embora eu não o admitisse estava doente e tinha de ser rapidamente tratado para não ter maiores danos, pois não dormia á muitos dias, não sei se por respeito ao Homem da batina, se por outra qualquer razão que me escapa, anui, ele já tinha tudo tratado (soube-o mais tarde) na Casa de Saúde do Telhal, casa dirigida por Frades da Ordem Hospitaleira de São João de Deus, e no dia seguinte lá fomos os dois, com uma paragem rápida em Algueirão para uma visita de cortesia a um seu Colega Padre nessa Paroquia.

Lá chegámos ao Telhal, fui consultado pelo Professor Pedro Polónio, um Psiquiatra famoso na época, que me envia para o Hospital de Santa Maria para fazer um Electoencefalograma, com o resultado deste, é feito o diagnóstico, e de seguida medicado, sigo para casa, mas dormir nada, a coisa ainda se agrava mais, e desta vez é o Amigo Zé e Esposa que vão comigo ao Telhal, só tarde compreendi, mas esta era uma consulta sem regresso, fico contra a minha vontade encarcerado, tento por todos os meios escapar mas nem a minha preparação nos Fuzileiros me ajuda a saltar aqueles muros enormes acompanhados duma vala tipo Jardim Zoológico na zona dos Elefantes, chovia a potes e encharcado que nem um pinto tenho que dar a mão á palmatória, e fazer-me á vida, isto é, entrar no Pavilhão onde me esperavam os Frades Enfermeiros, e esperar por uma oportunidade de fugir dali que com certeza iria aparecer.

Foi uma luta renhida entre mim e os remédios que teimavam
em não me pôr a dormir, foram ainda algumas semanas até que a coisa começou a fazer algum efeito, e a colocar-me como um cordeirinho criado á mão, a partir daí mansinho e cordato já nem pensava em saltar o muro, comecei até a ter o privilégio de sair até á Povoação mais próxima (Recoveiro) levando comigo alguns Doentes em quem depositava mais confiança.
Neste altura tinha toda a confiança dos Frades e dos Doentes pelo que ia ajudando, em especial nas refeições onde me dirigia á cozinha passando pelos túneis existentes de um e outro lado da estrada e lá íamos trazendo comida para algumas dezenas de internados, alguns chegados das guerras Ultramarinas completamente «apanhados do clima», á noite de Enfermaria em Enfermaria, para verificar se os Doentes não tinham a cabeça tapada, para que não asfixiassem, de dia para não torrarem ao Sol, tudo isto me ajudava a passar o tempo.


Tinha um carinho especial pelos Militares chegados das guerras, pois ainda estava fresca na minha memória, a estadia nos Fuzileiros, e no Hospital da Marinha onde tinha permanecido durante 78 dias, e onde «Observei» muita desgraça que aconteceu aos meus Camaradas Marinheiros, andava de olho aberto com alguns mais propensos a cometer o suicídio, e chegado aqui tinha um Doente (Rapaz da minha idade, bom estudante segundo os Pais, que sabe-se lá porquê, desaparafusou) e que não obedecia aos Frades Enfermeiros, mas comigo ia a todo o lado até ao Barbeiro que ele odiava, assim no dia 13 de Maio de 1967 sou incumbido ou melhor pediram-me para ir com o «Barbas» ao Pavilhão de São Lucas (todos os Pavilhões (que eram separados fisicamente) tinham nome de um Santo) quem entrasse neste Pavilhão normalmente só iria sair na horizontal, pois a esperança de cura, tinha-se esfumado.



Entrei aí numa sala de grandes dimensões, uma televisão quase junto ao tecto, mesas corridas preparadas para o almoço, sem facas nem garfos, e pratos e canecas de metal, todos os Doentes com batas vestidas (faziam assim as necessidades fisiológicas sem tirar qualquer peça de roupa), nesse momento saía do Avião Caravelle da T.A.P. na Base Aérea de Monte Real o Papa Paulo VI, que Salazar tinha dito que não entrava em Portugal enquanto fosse vivo, afinal entrou e Salazar é que foi ao beija-mão.
Saí dali, logo que o «Barbas» se distraiu da minha presença, e este é um dos meus «fantasmas» que me tem acompanhado ao longo destes mais de quarenta e cinco anos, são imagens terríveis, apesar do muito por que já tinha passado, esta vai comigo para a cova, desculpa lá ó «Barbas» mas não tinhas outra saída, ou ias comigo a bem, ou com eles a mal.


Até que um dia o Médico assistente Dr. João Fragoso Mendes me diz para ir passar o fim de semana a casa, como em casa não tinha senão as paredes, aproei ao Cacém onde vivia uma das minhas Irmãs, carregado de comprimidos bati á porta disse ao que ia, e lá me acolheram ela e o meu Cunhado, isto foi no Sábado no dia seguinte lembro-me de ir até Palhais junto á Escola de Fuzileiros, e onde tinha deixado uma namorada sem dizer água vai, quando de lá dei o fora com destino a Espanha, tinha-se passado um ano e a Rapariga se calhar até já estava casada, o que sei é que a Família me disse que estava na casa duma Avó no Barreiro, (para não me mandar passear) andei por lá á procura duma Avó qualquer, pois nem a morada tinha, até que ao fim da tarde já cansado, e desanimado e acelerado talvez pela falta de medicação regresso á casa da minha Irmã, lá chegado emborco uma quantidade de comprimidos que me pôs fora de combate durante cinco dias, adormeço nesse Domingo no Cacém, acordo na Quinta Feira seguinte no Telhal, parece que com poucas probabilidades de acordar, mas isto de pedra ruim não partir, não é só conversa, como se comprova!

 

Claro que não recordo nada desses dias sei posteriormente que me fizeram uma lavagem ao estômago, e safei-me. Quando ao fim desses dia me levantei, verifiquei que estava coxo, talvez por ter estado horas ou dias na mesma posição o músculo duma perna recusou-se a andar, mas lá me fui arrastando e quando cheguei á rua peguei num pau que por lá encontrei e com ele a fazer de bengala, cruzo-me com um Frade que até  julgava (ou era mesmo) meu  Amigo, que na brincadeira me diz umas graçolas por eu ir de bengala, não gostei da graça e disse-lhe que lhe dava uma paulada, o que fui dizer, o gajo foi logo chamar os «gorilas» (sim havia lá Frades preparados para enfrentar qualquer Doente que tivesse alguma fúria ou fosse agressivo) e aí vou eu transferido para o Pavilhão do Sagrado Coração, onde se levam (levavam?) electrochoques, estou lixado, agora é que os gajos me vão chegar a roupa ao pêlo.


Sou salvo no próprio dia, pela chegada da visita do meu Tio Júlio, que ia acompanhado de um Padre que parece que era exorcista ou coisa parecida, dali da zona do Maxial, nunca tive coragem de esclarecer isto com o meu Tio, e agora já é tarde, expliquei ao Padre que estava ali por castigo, e que me iam dar cabo do canastro, ele deve ter falado com alguém responsável da casa, e nesse mesmo dia fui dormir á minha enfermaria, mas durou pouco esta acalmia, os meus miolos devem ter levado um abanão com aquela dose reforçada de comprimidos e os cinco dias de coma, e andava em brasa, não me podiam dizer nada que refilava, e aconteceu mais uma vez, com outro Frade, desta vez o castigo foi colocarem-me na sala da insulina ( sim a insulina que trata diabéticos também trata, algumas doenças mentais) amarrado de pés e mãos, a levar doses cavalares de medicamentos, e assim estive não sei quantos dias, até que chegou a minha salvação, a minha Irmã Arlete que não me via desde o dia que sai de padiola da casa dela, foi fazer-me uma visita.


Chegada ao local com o meu Cunhado, dirigiu-se ao Pavilhão onde eu deveria estar e estava de facto não na enfermaria mas amarrado na tal sala que atrás falei, pergunta por mim e ninguém sabe onde estou, até que vai falar com o Enfermeiro José Manuel (o único não Frade existente na altura, na Casa de Saúde) e que ela sabia que me conhecia bem, e este vai á sala onde eu estava (aparentemente não sabia que eu estava preso de pés e mãos) pois diz-me para me levantar para ir ter com as visitas, acenei-lhe que estava amarrado ele saiu e voltou rapidamente (deve ter ido falar com algum superior) desamarra-me e é amparado a ele que venho até ao Jardim onde tinha os meus Familiares, viram o estado em que eu estava, contei-lhe o porquê e como me tinham amarrado, e solicitei que rapidamente fossem ter com o nosso Tio Januário que também morava no Cacém e era a Pessoa que tinha depositado a quantia de quatro contos para eu lá estar, e tinha de ser ele a assinar para eu sair sem alta Médica, assim aconteceu um ou dois dias depois! Não fora a visita desse Domingo e hoje não estaria aqui a contar como foi, não tenho dúvidas sobre o que se seguiria.
Termino mais uma tentativa de afastamento dos meus «fantasmas» e apanhando os cacos que, andam por aí espalhados.
 

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