quinta-feira, 24 de abril de 2014

JÚLIO ISIDRO ESCREVEU, EU PUBLIQUEI

Grande Júlio Isidro, falar claro nos dias de hoje, já tem custos «quase» como, no tempo da outra senhora, mas há sempre alguém que não tem medo, e não se acomoda á moda vigente, como é o caso.
Em Portugal não se fala, sussurra-se, o medo de outros tempos veio para ficar, um Povo que cala consente, raramente assume de cara levantada e peito feito aquilo que lhe vai na alma, é pisado e repisado, e pensa sempre que são os outros que têm de tirar o pé de cima do seu, nunca ser ele a retira-lo, não assume as suas dores não vá o vizinho ou amigo não gostar do «gemido». Parabéns Júlio Isidro, pela clareza e frontalidade do seu texto!


Júlio Isidro


 NÃO, NÃO ESTOU VELHO!!!


NÃO SOU É SUFICIENTEMENTE NOVO PARA JÁ SABER TUDO!


Passaram 40 anos de um sonho chamado Abril.


E lembro-me do texto de Jorge de Sena…. Não quero morrer sem ver a cor da liberdade.


Passaram quatro décadas e de súbito os portugueses ficam a saber, em espanto, que são responsáveis de uma crise e que a têm que pagar…. civilizadamente,  ordenadamente, no respeito  das regras da democracia, com manifestações próprias das democracias e greves a que têm direito, mas demonstrando sempre o seu elevado espírito cívico, no sofrer e ….calar.


Sou dos que acreditam na invenção desta crise.


Um “diretório” algures decidiu que as classes médias estavam a viver acima da média. E de repente verificou-se que todos os países estão a dever dinheiro uns aos outros…. a dívida soberana entrou no nosso vocabulário e invadiu o dia a dia.


Serviu para despedir, cortar salários, regalias/direitos do chamado Estado Social e o valor do trabalho foi diminuído, embora um nosso ministro tenha dito decerto por lapso, que “o trabalho liberta”, frase escrita no portão de entrada de Auschwitz.


Parece que alguém anda à procura de uma solução que se espera não seja final.


Os homens nascem com direito à felicidade e não apenas à estrita e restrita sobrevivência.


Foi perante o espanto dos portugueses que os velhos ficaram com muito menos do seu contrato com o Estado que se comprometia devolver o investimento de uma vida de trabalho. Mas, daqui a 20 anos isto resolve-se.


Agora, os velhos atónitos, repartem o dinheiro entre os medicamentos e a comida.


E ainda tem que dar para ajudar os filhos e netos num exercício de gestão impossível.


A Igreja e tantas instituições de solidariedade fazem diariamente o milagre da multiplicação dos pães.


Morrem mais velhos em solidão, dão por eles pelo cheiro, os passes sociais impedem-nos de  sair de casa,  suicidam-se mais pessoas, mata-se mais dentro de casa, maridos, mulheres e filhos mancham-se  de sangue , 5% dos sem abrigo têm cursos superiores, consta que há cursos superiores  de geração espontânea, mas 81.000  licenciados estão desempregados.


Milhares de alunos saem das universidades porque não têm como pagar as propinas, enquanto que muitos desistem de estudar para procurar trabalho.


Há 200.000 novos emigrantes, e o filme “Gaiola Dourada”  faz um milhão de espectadores.


Há terras do interior, sem centro de saúde, sem correios e sem finanças, e os festivais de verão estão cheios com bilhetes de centenas de euros.


Há carros topo de gama para sortear e autoestradas desertas. Na televisão a gente vê gente a fazer sexo explícito e explicitamente a revelar histórias de vida que exaltam a boçalidade.


Há 50.000 trabalhadores rurais que abandonaram os campos, mas há as grandes vitórias da venda de dívida pública a taxas muito mais altas do que outros países intervencionados.


Há romances de ajustes de contas entre políticos e ex-políticos, mas tudo vai acabar em bem...estar para ambas as partes.


Aumentam as mortes por problemas respiratórios consequência de carências alimentares e higiénicas, há enfermeiros a partir entre lágrimas para Inglaterra e Alemanha para ganharem muito mais do que 3 euros à hora, há o romance do senhor Hollande e o enredo do senhor Obama que tudo tem feito para que o SNS americano seja mesmo para todos os americanos. Também ele tem um sonho…


Há a privatização de empresas portuguesas altamente lucrativas e outras que virão a ser lucrativas. Se são e podem vir a ser, porque é que se vendem?


E há a saída à irlandesa quando eu preferia uma…à francesa.


Há muita gente a opinar, alguns escondidos com o rabo de fora.


E aprendemos neologismos como “in conseguimento” e “irrevogável” que quer dizer exatamente o contrário do que está escrito no dicionário.


Mas há os penalties escalpelizados na TV em câmara lenta, muito lenta e muito discutidos, e muita conversa, muita conversa e nós, distraídos.


E agora, já quase todos sabemos que existiu um pintor chamado Miró, nem que seja por via bancária. Surrealista…


Mas há os meninos que têm que ir à escola nas férias para ter pequeno- almoço e almoço.


E as mães que vão ao banco…. alimentar contra a fome , envergonhadamente , matar a fome dos seus meninos.


É por estes meninos com a esperança de dias melhores prometidos para daqui a 20 anos, pelos velhos sem mais 20 anos de esperança de vida e pelos quarentões com a desconfiança de que não mudarão de vida, que eu não quero morrer sem ver a cor de uma nova liberdade.


Júlio Isidro



quarta-feira, 9 de abril de 2014

FAZ HOJE QUARENTA E OITO ANOS

Ora cá estou eu de volta ao blog, mais propriamente ao «Purgatório» onde vou tentando espiar os meus pecados, não vai ser fácil ver-me livre de todos, mas vou tentando atenuar a lista que é longa, hoje como se poderá ver, é mais um da longa lista, e daqueles de fazer tremer as pedras da calçada, para começar direi que é dia de aniversário, não de anos vividos mas de asneiras passadas, 48 é um número já impressionante, a data do acontecimento é 9 de Abril de 1966, Sábado de Aleluia, na Escola de Fuzileiros, em Palhais e em todo o Mundo Cristão.


Mas vamos ao inicio, estava na Marinha, na Escola de Fuzileiros em Vale de Zebro, com castigos continuados, uma longa lista fazia parte do meu cardápio, tinha atingido a 4ª classe de comportamento, creio que a seguir já não havia mais nenhuma, e nessa classe nem em armas de fogo me deixavam pegar, a única arma, se assim lhe posso chamar era o velho sabre da espingarda Mauser, que me servia para fazer plantões de castigo, chegados aqui, e numa especialidade onde os tiros e armas de fogo eram o pão nosso de cada dia, recebo ordem de marcha para ser transferido para outra Unidade da Marinha, o Alfeite, mau, agora é que a porca torce o rabo, dali não consigo ir a salto, mas vou ter de arranjar maneira de me safar desta, o Oficial de dia acompanha-me ao autocarro Militar que fazia o transporte do Pessoal para o Alfeite e volta, e diz ao Motorista para largar este gajo (o gajo era eu) só no Alfeite, pois bem Manel, já te dou a resposta.



O autocarro arranca, anda umas centenas de metros e pára junto á Porta de Armas, foi o momento para eu desopilar dali a grande velocidade pela mata dentro, os locais para sair da Escola conhecia-os todos de fio a pavio, andei dentro da Unidade quase uma semana dado com o ausente, e posteriormente como desertor, ajudava na cozinha para poder forrar o estômago, pois não podia entrar no refeitório sob pena de ser visto por quem não devia, durante esse tempo saía da Unidade de salto como fazia quase sempre, e ia congeminando a maneira de me safar desta sem males maiores, mas chegado aqui a única safa era dar o salto para o Estrangeiro, transmiti a ideia a alguns Amigos Civis em Palhais e combinámos fazer-mo-nos ao caminho, eu, o Hugo, e o Carlos Bento, nesse Sábado juntámo-nos eu e o Carlos na Sociedade Recreactiva de Palhais, mas o Hugo roeu a corda!


Mas nem com essa baixa de última hora desistimos, por volta da meia noite lá seguiram estes dois aventureiros, com destino a Marvão no Alentejo, levávamos como G.P.S. uma agenda de bolso com o mapa de Portugal, e meia dúzia de Escudos, e durante cinco dias e cinco noites sempre a pé, e debaixo de chuva, escondendo-nos sempre que víamos alguma viatura pois não tínhamos dúvida que o alerta já tinha sido dado, ao quinto dia chegámos a Elvas, a trovoada com chuva forte não parava, abrigava-mo-nos junto de árvores, decidimos então alterar a rota e ir tentar a sorte na Fronteira do Caia, chegámos de manhã, o Rio transbordou e a cheia era de meter medo, ali andámos a tentar arranjar o local mais ou menos seguro para atravessar o Rio, e quando demos por isso, estávamos apanhados, a P.I.D.E. deitou-nos a mão, levados para o Posto, ficamos aí sentados num cubículo, á espera de levar uma coça, coisa em que os esbirros eram especialistas, mas nada acontecia, até que ao fim de algumas horas somos metidos dentro dum Citroen 2 cavalos e levados para outro posto da P.I.D.E. agora em Elvas.

Aí chegados, dão-nos de comer, (eram uns queridos) e separados, (por mais de trinta anos) na manhã seguinte sou novamente interrogado, acompanhado duns tabefes, e o sacana do P.I.D.E. diz-me então o menino é tropa e não dizia nada? Não, como ainda tinha dezanove anos estava á espera que me soltassem, para eu voltar a dar o fora! É o soltas, vais para uma Unidade Militar aqui em Elvas, e assim foi, durante cinco dias fui o preso mais popular do Quartel de Caçadores Nº 8, findas estas férias forçadas, chega um duo de Fuzileiros de pistola á cintura e algemas no cinturão para me levar de volta, não para o Forte de Elvas,  que era o meu maior receio, mas para o Alfeite, o destino que eu quis driblar quando fugi do autocarro na Porta de Armas da Escola de Fuzileiros, afinal atravessou-se agora no meu caminho, e desta feita era mesmo para ver o Sol aos quadradinhos.


Que se lixe, perdido por um perdido por mil, e lá seguimos os três de comboio até Santa Apolónia durante horas, eles com medo que eu tentasse fugir, eu com receio de levar um tiro, pois ambos tinham chegado á pouco duma comissão no Ultramar, e vinham nervosos!
Correu tudo bem, fizemos o percurso Santa Apolónia a pé até á Doca da Marinha, as Pessoas a olharem espantadas pois via-se á légua que o gajo que ia á civil no meio dos dois marmanjos ia preso, embarcámos na Vedeta para o Alfeite e aqui chegado fui engavetado, mais vinte e dois dias, findos os quais me dão a grande noticia, afinal não vais para o Forte de Elvas, vais antes para casa e ficas á espera de ser chamado para cumprir o Serviço Militar no Exercito e completo, pois este ano e tal aqui não conta para nada, foi só prejuízo que destes á Armada, vai em paz, e fui! Só que com a aprendizagem que aqui tive, o Exercito viu-me por um canudo!